Somos o que Somos

Espera.
Para seguirmos com esta conversa temos que tomar algo!
Que tal um refresco?
Fala sério! Alguém ainda fala refresco?
Claro que sim!
Estou aqui falando!
E da nossa boca sai tantas preciosidades - e também tantos impropérios - que você nem imagina!
Então, vamos tomar esse refresco enquanto você lê os meus dizeres.
Não tenho ideia de como foi sua infância, mas a minha foi das melhores. Tive tudo que uma criança feliz pode ter. Menos dinheiro.
E daí! Nunca fui exceção. Os demais também não tinham. Éramos muito felizes assim mesmo, mas...
Crescemos! – Confesso que no meu caso... não muito! Mas seguimos adiante.
Na adolescência – para ser sincera não tinha ideia do que era ser adolescente -, mas sei que a situação mudou um pouco. Para melhor ou para pior não é o caso, apenas mudou.
Ah! Os amores! As paixões! Tudo parecia uma explosão galáctica!
E o curso da existência seguiu.
Você se apaixonou? Eu, sim!
E dancei bastante também. Com Roupa Nova “Whiski Go-Go”, “Rivers of Babilon”, com Boney M. (Obs. Nem sabia que era reza!) Seria uma lista enorme, não da para escrever todas aqui.
Apaixonei-me por todos eles! E por muitos mais! Ah! Como eram de tirar o sono!
Foi assim com todos nós naquele tempo de incertezas.
E rimos, sofremos, fomos felizes e infelizes. Estudamos e trabalhamos. Não estou dizendo que trabalhamos cada uma nas profissões escolhidas! As donas de casa trabalham “pra caramba”! .
Enfim, vivemos.
Amadurecemos.
E aqui chegamos!
Velha? Eu?
Claro que sim! Segundo os padrões da sociedade sou sim.
Porque se há uma situação que não pode – de jeito nenhum – ser mudada é a existência. A gênese é imutável!
Se me sinto velha?
Confesso que algumas vezes sim. Só algumas vezes. Bem poucas.
Se isso me entristece?
Não mesmo.
Há tempos meus grisalhos desfilam esvoaçantes bem no alto da minha cabeça, às vezes curtos, às vezes nem tanto.
Tranquila! Tudo envelhece. Melhor tomar ciência disso!
E os desgastes chegam. As dores também. Inclusive as físicas!
Opa! Espera ai! O que é isso?
Está carregando o quê nessas costas além dos suas próprias vivencias?
Para!
Não carregue o que não é seu!
Cada um tem seu pacote!
Não sofra as dores que não são suas.
Já tem seus analgésicos? Melhor não se esquivar deles!
Não queira ter razão em tudo, nem resolver entreveros alheios, nem pagar contas do que não comprou para si mesma. Isso sufoca! Da insônia, provoca olheiras e faz subir a pressão!
Ah! Isso cansa!
Chega de dar presentes também. Receber pode!
Ah! Para! Que coisa chata acharem que somos “Jaque”! Já que esta aposentada podia.... podia isso, podia aquilo! Já que não tem mais idade para ...podia.... Esta é “pra acabar mesmo”!
Sempre uma sugestão aqui, uma reprimenda ali!
É assim que nos querem? Em regime de submissão!
Não pode não! Não deixa não!
Vai passear! Tomar café com as amigas. Se preferir, uma cerveja, uma caipirinha – outro dia tomei uma e fiquei logo alegrinha!
Essa terapia é de graça, porque não tem preço mesmo!
Vai fazer o que quiser! Nunca o que os outros querem.
Chega de viver “os outros”.
Quero viver minhas próprias situações. Minhas próprias dores. Artrose, artrite... e mais “ose” e mais “ite” fazer o quê! É o desgaste que já mencionei! Tenho sim! E doe. Mas isto aqui tem tratamento. Então não fuja! A medicina e as terapias estão ai ao nosso favor.
Celulite? Tenho também! E rugas, e flacidez, e gordurinhas, e estrias.. e por ai vai!
Se alguém chegar e te dizer:
-“Olha só, você não mudou nada”!
Não acredite, é mentira.
Mudamos sim! Um dia após outro temos mudanças, nossas células não são as mesmas, nossas marcas aparecem! Já não podemos comer tudo que gostaríamos, nem somos mais tão ágeis, a cintura mudou, os dentes, o cabelo e a pele também! E o sono já não é de noite inteira.
Mas o cérebro tem que ser cuidado, preservado. O Coração também. Enquanto podemos.
Então, levante a sua cabeça bem na frente do espelho e diz para quem está lá:
-”Você está pensando o quê”? Que alguém vem aqui resolver seus conflitos?
Hum! Vai esperando e sonhando! Vai é escutar uma fileira de “porquês” que você fez ou que deveria fazer que vai te dar um cansaço daqueles!
Conselho de amiga: vista uma roupa confortável, que goste e de preferencia novinha. E vai para onde te der na “telha”!
Porque a única razão pela qual você está aqui agora tendo essa conversa comigo é que há vida aí bem dentro de você. E é sua. Somente sua. Não permita que te enfiem goela abaixo situações ou obrigações que outros decidiram para você, sem nem te consultar. Viva os amores que queira amar, as alegrias que te faz sorrir, respire ares que queira respirar. Vai por caminhos que sempre quis trilhar e, por algum motivo – real ou inventado – não pode.
Chegamos, sim, ao outono da vida, mas ainda somos toda uma primavera e com muita sabedoria guardada dentro de nós! Isto ninguém nos tira.
Então, vamos tomar mais um refresco?
Porque hoje tenho 20 anos.
By Marlene Rodrigues



